Conto de Fadas Pós-Moderno


Não sabia por que havia nas pessoas tamanho medo – tão grande – da solidão. Não entendia a ideia obsessiva que todos praticavam de procurar alguém com quem ficar junto para sempre, a busca incansável por uma companhia agradável, incondicional e eterna...

Hellah era feliz – muito e bastante – quando vivia na solidão profunda do mundo que criara, no vazio cheio de luminosidade que preenchia os dias que eram os seus. Lembrava-se de que a indiferença dos outrens era o que dava-lhe mais prazer, posto que sentia-se leve e livre para ser o que era, o que pensava ser e o que sempre seria, sem dissimulações ou máscaras.

Até que ele apareceu. Pode ser que a limitação de um nome seja desnecessidade grande para a compreensão da história. Nome dele, em verdades todas, nem faz diferença mínima no desenrolar dos fatos. Pode ser que não. Talvez se Hellah fosse mística ou fútil, encontrasse significado qualquer que fosse numérico, quiçá astrológico, para o nome dele... O caso, entretanto, não configura-se em tais formas.

Importante – isso sim – é descrevê-lo. Ele é algo assim que nem um príncipe encantado: belo, inteligente, corajoso, forte e, ao mesmo tempo, romântico, carinhoso, atencioso e apaixonado. É bom que se diga que é apaixonado por Hellah, o que poderia causar inveja a qualquer uma dessas garotas sonhadoras e esvoaçadas que há por aí, mas que causa, a Hellah, um misto de compaixão e tédio. Compaixão por ele, moço de características tão singulares, que bem poderia conquistar quem quisesse, ter a ilusão besta de escolher justamente o enamorar-se dela... Tédio pelo desperdício de tempo e energia dele, gastos em vãs tentativas de acordar um coração já em coma por período muito longo de dormência....

Ele é o típico príncipe encantado. Problema grande é Hellah não ser princesa. Se tivesse que ser encaixada numa dessas historinhas de contos de fada, certo seria que fizesse papel de madrasta má, das irmãs cruéis ou mesmo da bruxa. Quem sabe até do sapo! Nunca, porém, dariam a Hellah o papel da princesinha linda e sensível. Falta-lhe a bondade e a delicadeza da princesa. Falta-lhe um coração capaz de sentir uma paixão fulminante, mas, principalmente, a disposição de lutar pelo seu amor, de deixar tudo e fugir com ele, ainda menos por ele, sem nem mesmo olhar para trás. Falta-lhe a insensatez dos românticos, a insanidade dos apaixonados e, sobretudo, a vontade de afastar-se da solidão...